a Caminho
Não há prova possível, mas mesmo assim acredito que seja verdade: existem lugares no mundo onde à nossa chegada ou partida se acrescentam, de forma misteriosa, as emoções de todos os que por lá chegaram ou de lá partiram antes de nós. [...] No pórtico da catedral de Santiago de Compostela encontra-se uma coluna de mármore com marcas profundas de dedos, uma garra comovida, expressionista, moldada por milhões de mãos, entre as quais a minha. [...] Se desconsiderarmos a minha mão, se eu nunca ali tivesse estado, a garra lá continuaria, graças aos dedos de todos os mortos que desgastaram o mármore duro. Mesmo assim, ao colocar a minha mão no mármore duro participei de uma maneira misteriosa numa obra de arte colectiva. Uma ideia que se materializa é sempre um fenómeno espantoso. A força de uma ideia levou soberanos, lavradores e monges a pôr a mão exactamente naquele sítio naquela coluna, cada mão individual tirava uma ínfima quantidade do mármore duríssimo, tornando visível, justamente pelo mármore que tinha desaparecido, a forma de uma mão.